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segunda-feira, 21 de novembro de 2016

“Não se forma cultura com ações pontuais”, 
diz engenheiro sobre as práticas sustentáveis no Brasil


Rio de Janeiro - Nelson Suassuna faz um panorama do mercado energético brasileiro e pontua qualidades em seus profissionais

Fabrício Alves Moraes, para o Procel Info -   Fonte: http://www.procelinfo.com.br/




Rio de Janeiro - O Brasil vive dias de expectativas e mudanças no setor elétrico. Uma delas é o entusiasmo pela aprovação da Lei 13.280/2016, que fornece a aplicação de recursos para os programas de eficiência energética no país e redireciona 20% desse valor ao Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel). O que se espera com essa nova legislação é o desenvolvimento de uma cultura sustentável que ajude a promover o combate de desperdício de energia tanto para os consumidores de alta tensão, quanto para os clientes residenciais.


Para falar sobre este assunto, o Portal Procel Info conversou com o engenheiro e pesquisador Nelson Suassuna. Com ampla experiência no setor de energia, petróleo e gás, Nelson passou por grandes empresas, entre elas, a Petrobras, quando desenvolveu trabalhos na área de Segurança, Meio Ambiente e Saúde. O engenheiro atuou até recentemente como gerente no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, o Comperj, onde comandou equipe e fiscalizou contratos no âmbito de QSMS/RS (Qualidade, Segurança, Meio Ambiente, Saúde e Responsabilidade Social).

No ano passado, o engenheiro escreveu um artigo sobre a prática de eficiência energética, citando exemplos de eficácia e desperdício, objetivando a promoção de cultura sustentável. “A reflexão que é possível manter o conforto, a produção de bens e serviços e a qualidade de vida em equilíbrio com o meio ambiente e os recursos naturais é a missão que a Eficiência Energética repercute”, avalia em um trecho de seu artigo.

Na entrevista, Suassuna - que acredita que teremos bons resultados em curto prazo - avalia como enxerga todo o âmbito de eficiência energética no Brasil. Falou das prerrogativas e pretensões do setor para a mudança de cultura de desperdício. Elogiou os seus colegas e as metodologias atuais aplicadas.“O Brasil possui excelentes técnicos em eficiência energética como também excelentes iniciativas”, disse. Ele também fez uma análise sobre o setor de óleo e gás. Segundo Nelson, não existia prática para a economia de energia até poucos anos atrás e que hoje, após esta implementação de ações de eficiência energética, o processo de refino se tornou mais eficiente, realizando também o reuso de água nos processos de exploração.

Confira a seguir os principais trechos da entrevista:

Procel Info - Como o senhor avalia as ações de eficiência energética aplicadas no Brasil?

Nelson Suassuna - Estamos entrando em um cenário que deverá promover a implementação de ações sistêmicas e abrangentes de eficiência energética com a aprovação da Lei nº 13.280, em maio deste ano. A expectativa é que tenhamos bons resultados em curto prazo. Anteriormente as ações estavam sendo pontuais - a maioria - sem observar a continuidade, a abrangência e a melhoria contínua.

Procel Info - Quais áreas devem ser priorizadas e quais barreiras ainda impedem o crescimento da eficiência energética no país?

Nelson Suassuna - Todas as classes de consumo e seus segmentos devem ser envolvidos, porém, as classes industrial/comércio e serviços deveriam ter o maior foco, posto que, somadas, respondem por cerca de 60% do consumo energético. Sobre as barreiras que bloqueiam o crescimento da eficiência energética (EE) podemos citar a falta de informação sobre o que é e os resultados de redução do consumo que poderão advir através de ações. Disseminar o conhecimento concomitantemente com estímulos e incentivos, mas sem subsídios, removerá os bloqueios existentes atualmente. Cabe destacar que ações comportamentais retornam bons resultados com investimento zero.

Procel Info - Em muitos países a eficiência energética já faz parte do cotidiano da sociedade. Como o Brasil pode aprender com essas iniciativas internacionais para estimular e disseminar a cultura da eficiência energética no país?

Nelson Suassuna - A troca de conhecimento sempre eleva o nível, contudo, o Brasil possui excelentes técnicos em EE como também excelentes iniciativas. O grande diferencial em relação a outros países está na continuidade dos programas que levou a formação da cultura. Não se forma cultura com ações pontuais. Os resultados de outros países devem ser apresentados como exemplo do que poderá ser obtido com a implementação da EE na sociedade.

Procel Info - O atual cenário econômico do país pode ser um estímulo para a adoção de medidas de eficiência energética, principalmente entre os grandes consumidores (indústrias, grandes empresas, centros comerciais, hospitais, condomínios)?

Nelson Suassuna - Com certeza! Historicamente, observamos que a eficiência energética é lembrada pelos consumidores somente quando a economia apresenta desempenho sofrível. Infelizmente, em cenários econômicos favoráveis, o desperdício não é tratado. Importante mudar essa cultura arraigada na nossa sociedade como um todo.

Procel Info - E em relação ao consumidor residencial. Quais são as alternativas para ter um uso mais racional da energia?

Nelson Suassuna - Diferente da indústria, onde ações específicas de EE em plantas (consumidores eletro intensivos) ou segmentos são passíveis de bons resultados, essa classe é pulverizada. As ações educativas, comportamentais e de conscientização são as que remetem a resultados positivos de eficiência nesta classe. Importante que sejam contínuas para formar cultura, como por exemplo, observar o Selo Procel de Economia de Energia na aquisição de eletrodomésticos, como ar-condicionado, geladeira, máquina lava roupas, etc; priorizar lâmpadas eficientes na substituição, eliminar vazamentos d’água, usar a água potável de forma racional etc. A inclusão do uso racional e desperdício da água é ponto importante. Essa classe tende a entender que a água cai do céu e chega direto nas torneiras.

Procel Info - Em artigo publicado em agosto de 2015, o senhor orienta aos usuários tomarem medidas cautelares para a redução do consumo. Os grandes edifícios e empresas já abraçaram a causa? Há uma conscientização do setor?

Nelson Suassuna - Pena não poder referendar o abraço da causa! Algumas indústrias, em determinados segmentos industriais, implementam ações de EE, objetivando redução do consumo de energéticos e água. O impulso é o peso desses insumos na formação do custo dos produtos e/ou processos. Necessário que a causa seja também abraçada por todos os segmentos indústrias, independente do percentual de incidência dos energéticos e da água na formação dos custos. A observação acima é aplicável ipsis litteris ao comércio, com destaque para os centros comerciais e shoppings centers, e serviços. Quanto aos edifícios residenciais, a experiência denota que a eficiência energética e uso racional da água é contemplada nos novos, principalmente nos destinados a alta renda. Os edifícios residências mais antigos resistem a implementar ações de EE. É comum considerarem a instalação de banco de capacitores e enquadramento tarifário como ações de eficiência. Por fim, temos os prédios públicos, com certeza os campeões de ineficiência hidro-energética. A conscientização é imperativa para todos os setores!

Procel Info - Qual é o planejamento estratégico que empresas de grande porte devem ter para implementar a cultura da sustentabilidade e eficiência em suas operações? Na sua opinião, como deve ser feito o trabalho de conscientização para que os velhos hábitos e desperdício sejam modificados?

Nelson Suassuna - O “X” da questão é a empresa aplicar a sustentabilidade e a eficiência energética como fatores diferenciais positivos de competividade em relação aos concorrentes na disputa do mercado. Cada segmento e suas empresas possuem características próprias. Então, não existe uma “receita de bolo” aplicável para todas as empresas. Vejo essa implementação integrada, não separada. O padrão atual é contemplar os aspectos econômicos e de mercado no planejamento. Quanto à conscientização, o trabalho partirá do governo como formulador da política nacional de eficiência energética, sendo a implementação desmembrada nos níveis estaduais e municipais, e, principalmente, com a participação efetiva e contínua das associações industriais, comerciais, de moradores, enfim, toda a sociedade organizada.

Procel Info - O senhor tem grande experiência no setor de óleo e gás. Como a eficiência energética é tratada nesse segmento? Quais soluções poderiam ser adotadas para tornar mais eficiente e sustentável o uso da energia e dos recursos naturais nesse segmento?

Nelson Suassuna - Não era prática a aplicação de ações de EE no setor de óleo e gás até poucos anos atrás. O que impulsionou a implementação de ações de eficiência energética foi o preço do petróleo acima dos USD 100/barril. A redução do consumo próprio nos processos de exploração e refino remete a maior volume de produto para venda. Hoje em dia, nas refinarias eficientes, o consumo próprio está em torno 7% do volume refinado. Esse percentual é obtido com a adoção de processos de refino mais eficientes, equipamentos elétricos eficientes, automação, reaproveitamento de calor, etc. Também passaram a ser realizadas ações para redução no consumo da água nos processos de exploração e refino. Hoje, o índice de reuso está crescente.

Procel Info - A adoção de fontes renováveis de energia, como eólica e solar, é viável na indústria de petróleo e gás?

Nelson Suassuna - É viável economicamente e uma prática sustentável. Algumas refinarias e plantas petroquímicas já adotam as fontes eólica e solar para geração de energia elétrica, complementando a demanda e a estabilidade do sistema com a geração própria por termelétrica ou fornecimento externo. A energia solar também é utilizada para aquecimento da água em algumas plantas.

Nelson Suassuna é engenheiro civil formado pela UFPB e pós-graduação em segurança do trabalho pela UFPE. Com 25 anos de carreira, tem ampla experiência no setor de óleo e gás e no mercado brasileiro de eficiência energética. Entre as principais atividades nesse período, foi consultor de eficiência hidroenergética da Unifei/Itajubá e na assessoria de Gestão Corporativa na Petrobras